top of page

Sobre Cachorros Loucos e Vampiros - Ensaio

Extraído do Capítulo 'O Cachorro Louco" do Livro "Um Peregrino do Tempo".




Apesar da tenra idade, ia aos cinemas de forma regular e nem sempre acompanhado de meu irmão, que por ser quatro anos mais velho, tinha seus próprios interesses e amigos. Meus pais sempre foram liberais e eu gozava de total liberdade para assistir ao que era exibido, não havendo muito rigor em relação à idade.


Ao assistir aos filmes eu sempre viajava e vivia as emoções, alegrias, espantos, tristezas e dores, identificando-me com esse ou com aquele personagem, como se fosse coadjuvante do grande elenco. Eram películas de aventuras, policiais, comédias românticas, faroeste, guerra, épicos e históricos, além dos de terror e suspense, incluindo os meus preferidos como os contos de Drácula de Bram Stoker, representado por Christopher Lee e Peter Cushing, no papel de Van Helsing, o caçador de vampiros. Peter Cushing também se notabilizou por representar Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle, em diferentes ocasiões.


As histórias de suspense e terror exercem um fascínio, pois flerta com um mundo que adentra às camadas profundas do inconsciente. Creio que todos nós temos uma atração por aquilo que nos excita, mas que depois nos deixa com pavor das sombras com seus monstros a saírem inesperadamente das penumbras da noite, para nos atacar. Os vampiros, por exemplo, sintetizam a suprema negação a Deus, na medida em que escolheram viver a “eternidade” se aliando às forças do mal, não suportando a luz, nutrindo-se da energia vital dos vivos, sugando o sangue, principalmente de belas jovens e crianças. O sangue somente pode ser produzido para os seres que aceitam a luz do Sol Criador e todo aquele que se refugia nas sombras, por negação da Criação, é condenado a viver nas profundezas da escuridão.


Jung associa a imagem do vampiro à expressão “sombra”, definindo-a como sendo aspectos de conteúdos de desejos reprimidos ou aspectos morais não construtivos, que o ego psicológico da pessoa é incapaz de reconhecer. Assim, os vampiros são projeções de nossas sombras que devem ser mortos pela luz, pela estaca cravada no coração e pela bala de prata. A estaca e a bala de prata constituem nos elementos a serem utilizados para o enfrentamento da “sombra”. Existe outro elemento que afasta os vampiros, como o alho e a água benta, mas estes são meros paliativos, a abrandar temporariamente o mal que continuará a nos assombrar.


A água benta representa a purificação mas será inócua se for apenas utilizada com um ingrediente ritualístico. Sozinha, somente afastará temporariamente nossos vampiros, reprimindo-os, alimentando-os, de tal forma que vão ganhando força, até o momento que inesperamente irão romper a aparente calmaria, como a fúria de um vulcão, a dominar-nos pelos instintos, fazendo-nos reféns de seus desejos. As sombras não devem ser negadas, mas sim analisadas e compreendidas, pois elas possibilitam trazer luz para a consciência aquilo que necessita ser saneado dentro de nós.


De nada adianta nos ungirmos fazendo nossas penitências e clamando por perdão após as confissões, se não houver a sinceridade pelo reconhecimento dos erros comentidos.


No cristianismo, fala-se em arrependimento, podendo este termo erroneamente ser interpretado como um sentimento de remorso por algo de errado que tenha sido praticado contra as leis de Deus. Mas o real sentido é mais profundo, pois a palavra vem da tradução para o latim da língua grega na qual os evangelhos foram escritos. No caso, arrependimento em grego é metanóia, ou seja, “meta” que é “após ou “com” e “nous” significa intelecto ou mente. Desta forma, arrependimento não é autoflagelo pelo sentimento de culpa, mas sim a necessidade de mudança de mentalidade e propósito. De nada adianta eu “tomar consciência” dos atos errôneos praticados pelo efeito das sombras, rezar e ungir-me com água benta da pia batismal para me redimir, se não fizer a mudança nas atitudes. Se eu tomo consciência de meus erros, não será lícito que venha a reincidir nos mesmos equívocos.


E para isso será necessário uma estaca ou uma bala de prata em nosso lado sombrio, para matar, pela consciência, nossos erros.


Mas, voltando àquela sala de cinema. As sessões determinavam por volta das 22:30 hs e não era raro ter que retornar sozinho para casa, andando pelas ruas desertas e sem luz, passando por uma ponte sobre o rio, local sinistro, pois no passado lá havia morrido um menino afogado e se comentava que ele aparecia às vezes nas noites de lua cheia. Neste ponto do caminho, acelerava o passo, às vezes correndo, e numa dessas disparadas tive um encontro com uma fera que surgiu silenciosamente das sombras às margens do rio desferindo uma profunda mordida em minha perna.


Não se tratava de nenhum monstro imaginário, mas sim de um cão acometido por hidrofobia, que assim como veio e me mordeu, desapareceu nas sombras da noite e foi morto no dia seguinte ao amanhecer. A hidrofobia é transmitida por morcegos hematófagos, como vampiros que se alimentam de sangue dos cães e outros mamíferos.


É curioso, pois recentemente estava a comentar com um amigo astrólogo, sobre o papel das estrelas fixas como instrumento de análise astrológica, já que ele tinha feito um curso sobre o assunto com o Assuramaya, um astrólogo do Rio de Janeiro já falecido e conhecido também por difundir esse conhecimento das correlações desses astros longínquos. Na ocasião desta conversa disse a ele que considero, em minhas análises e interpretações astrológicas, as estrelas com orbe de 1º sobre os planetas e pela minha experiência elas têm influência, apesar de estarem anos-luz da Terra.


Mencionei, como exemplo, sobre Procyon posicionada na Constelação de Cão Menor, em Câncer, que está associada a mordidas de cães hidrofóbicos e como esse amigo também é veterinário, perguntei se, como profissional da área, conhecia alguém que tivesse sido mordido por cão raivoso. Prontamente, ele me respondeu que nunca soube de casos, exceto pela literatura médica.


Foi então que eu disse a ele: Agora você conhece uma pessoa, que no caso sou eu próprio e mais, tenho Procyon cravado sobre o meu Marte, consignando o golpe do cão que escolheu a vítima certa. Marte e Procyon estão na casa 5, a mesma que contém Urano, que rege o inusitado, os acidentes, a barriga da perna e os filhos.


Isso me custou uma viagem às pressas, levado por mãe, ao Instituto Pasteur em São Paulo, onde foi dado início a um tratamento com uma série de aplicações de soro por injeções em volta do umbigo, ao longo de vários dias.


Paradoxalmente, não tive aversões a cães, muito pelo contrário, a partir deste momento tivemos o nosso primeiro cachorro, o Buggy, que alegrou minha vida, sendo meu companheiro de todas as horas daqueles dias. Depois do Buggy, foram dezenas de cachorros, que sempre estiveram ao meu lado compartilhando da vida. Hoje, os meus companheiros são dois, Nicolau e Fred que de ocasionalmente se envolve em contendas com outros cachorros e na separação dos briguentos continuo a levar mordidas na perna, mas sem a gravidade daquela primeira e inesquecível dentada.


Este foi o meu primeiro confronto com meus medos, com minhas sombras, que ainda continuam a me desafiar, mas hoje melhor atento para que as mesmas não sejam jamais ignoradas, pois integram minha estrutura psíquica que haverá de ser depurada no seu devido tempo.


Procyon em Marte continua a operar, assim como Urano regendo as pernas.

43 visualizações

Comments


bottom of page